Este é um post convidado, escrito por Jessyca Luana Teixeira, e (até o momento) o último na série de textos sobre como é a vida fora da Academia. Jessyca é doutoranda em Ecologia e Conservação da Biodiversidade na UESC, trabalhando com biologia marinha, mas por um bom tempo trabalhou também com consultorias – inclusive na caatinga, bem longe do mar. Pedi para ela escrever um pouco sobre como foi conciliar as duas coisas e ela gentilmente concordou :-)
Todos sabem que um doutorado não é tão simples obter, requer tempo, dedicação e dinheiro. Assim eu pensei que seria os meus principais obstáculos no doutorado. Fui aprovada, que legal!! Mas sem bolsa e com previsão incerta de ter. Veio aquele desespero, continuar ou desistir sem bolsa? Venho de uma família de muitos filhos e poucos recursos financeiros, não seria uma opção pedir ajuda financeira aos meus pais. Poderia trabalhar, claro!! Mas a julgar que o doutorado requer muito do aluno, considerei não dar conta. Mas como adoro desafios (e não tinha muita escolha) aceitei arriscar, pois não vivemos de fotossíntese (infelizmente) e precisamos pagar as contas.
No período de um ano sem bolsa, forneci consultoria ambiental para empresas diferentes. Após essa experiência tenho pontos a levantar sobre.
Com tantas viagens e compromissos para com as empresas, tive bastante dificuldade de acompanhar as disciplinas e atividades obrigatórias do programa, pois meu tempo era escasso e quando eu tinha algum “tempo livre” me encontrava muito exausta. Tive a compreensão de poucos professores que entenderam a situação e me ajudaram nos imprevistos que apareceram no período das disciplinas. Outros professores não foram tão compreensivos, chegaram a falar que eu teria que escolher uma ou outra atividade e que eu teria que arcar com as consequências.
Estava com a rotina de sair às 4:30 da manhã e retornava às 18:00 horas, destruída. Chegava em casa, abria o e-mail e tinha dezenas de atividades do doutorado para fazer e meu corpo só pedia cama.
Mas nem tudo é de todo mal.
- O pagamento era muito superior ao valor da bolsa que meus colegas estavam recebendo. Aproveitei e comprei muitos equipamentos para o campo do doutorado que não conseguiria com o valor da bolsa.
- Aprendi a trabalhar de forma mais empírica. No meio acadêmico somos treinados a trabalhar muito com teorias e revisões e definitivamente não é o que as empresas querem de nós. Aprendi novas técnicas de campo e novas formas de redigir.
- Tive a oportunidade de trabalhar com biomas e atividades diversas, além de trabalhar com uma equipe multidisciplinar, me acrescentando muito como profissional.
- Obtive experiência e fiz currículo. Isso me deixou bem satisfeita, pois sabemos que (no Brasil) ao terminarmos o doutorado, se não passarmos em um concurso para professor, é o fim. E REALMENTE É para aqueles que não possuem experiência profissional, ou seja, 90% dos acadêmicos. Acredito que seja o calcanhar de aquiles da pós-graduação. Pesquisei e observei que o mercado em geral pede pessoas que tenham o nível máximo de formação possível com no mínimo 5 anos de experiência (What the fu** is that?).
- Aprendi a lidar e passar informações para públicos diferentes do que é de acostume no meio acadêmico. Atividades como palestras e diálogos diários com a população e profissionais (que não são da área) me fez exercer o lado da extensão científica e foi gratificante. Com essa troca, aprendi muito também com o conhecimento popular e me fez enxergar com outros olhos o que a academia não considera ciência.
Um ano depois de começada a saga, estou com bolsa (finalmente), recuperando o “tempo perdido” que estive sem bolsa e colocando as coisas do doutorado para andar. Apesar de estar um pouco “atrasada” nas atividades do doutorado, hoje vejo como foi importante a experiência, me abriu diversos caminhos e me deu experiências únicas para a minha carreira profissional e pessoal.
Procurem ter experiências no mercado de trabalho, mesmo que seja como estagiário, fará toda a diferença no seu crescimento profissional e poderá te abrir portas para no futuro.
Sei que é anti-ético perguntar sobre a natureza dos trabalhos de consultoria mas queria saber como foi lidar com os diferentes biomas e se vc encontrou dificuldade em lidar com a literatura vasta dessas diferentes áreas de estudo?
Bom texto.
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Matheus, sempre trabalhei com uma equipe multidisciplinar. As empresas normalmente colocam algumas pessoas da região na equipe que possuem informações privilegiadas da área em questão. Então foi bastante aprendizado. O que não estava ao meu alcance, recorria aos amigos especialistas para a identificação, de resto, consegui me virar bastante estudando muito, além de trocar ideias com as pessoas da região.
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